quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Relacionamentos: a cultura do descartável


Há algum tempo venho pensando sobre o que a geração de hoje chama de “ficar com alguém”. Nunca vi problema nisso, mas depois de certa maturidade algumas coisas ficaram mais claras e passei a me questionar sobre tal atitude e o que ela acarreta para quem o pratica. Não tenho interesse aqui de dizer o que é certo ou errado, até porque acho que isto é algo que não cabe a mim, além de ser muito particular. Longe de mim querer julgar alguém, até porque eu estava no mesmo barco e por ter passado por algumas situações, consigo compreender. Mas sinto o desejo de compartilhar algumas experiências do “mundo de déb” (e olha que eu sou exigente e muito seletiva para este tal de ficar, imagina quem não é...) e espero que sejam úteis a quem está buscando o mesmo que eu (um relacionamento bom e verdadeiro), ou até mesmo aos que ainda estão confusos. Afinal, a reclamação ta geral...


A lei da atração


Posso dizer que sempre tive todos os caras que desejei (e os que não “conquistei” não completaram os dedos de uma mão), passando pela listinha dos cobiçados, modeletes, populares, gatos, charmosos e os nem tanto assim. Mas o fato é que eu pensava: quero este, e o tinha. Mas será que o tinha mesmo? Depois de um namoro de 5 anos e meio, e dois anos de solteira, percebi que na verdade o que passou a importar para mim era a conquista, a auto-afirmação de saber: eu quero, eu consigo, eu vou ter – ainda que seja por uma noite. Era aquela coisa da vaidade falar mais alto e saber que os caras que eu desejava também me desejavam. Que eu sou bonita, atraente, e que eu chamava mais atenção do que várias outras mulheres na mesma pista ou no mesmo bar, embora entre amigas nunca tive competição. Essa coisa de ego é complicada, e se alimentarmos a vaidade além do necessário, podemos virar refém dela. (vou escrever sobre isto em uma próxima oportunidade)

Acredito que muitas mulheres querem se sentir assim: desejadas, cobiçadas, disputadas. Faz bem ao ego, ao espelho, ao nosso lado narcisista. Mas faz mal para o coração. Afinal ser objeto de desejo não deve ser tão bom assim. Da mesma forma como, mesmo sem perceber, eu fazia dos caras apenas objetos de sedução, muitos fazem conosco da mesma forma. Só que na cultura do ficar impera a superficialidade. Afinal, podemos falar que tivemos alguém apenas por uma noite, por alguns finais de semana? Podemos dizer que conquistamos de fato? Não. Realmente a melhor palavra para definir é ficar, pois apenas estivemos com a pessoa por alguns momentos, nada além. E nenhum coração resiste muito tempo a isso.


Mentiras que gostamos de acreditar


Às vezes eu tentava me enganar, dizendo: quem sabe dali nasce alguma relação bacana? Afinal, se eu não ficar, não vou saber. Depois me dei conta que a ordem estava invertida. Porque não conhecer primeiro para depois ver se dali tem como nascer alguma relação legal, pautada também na confiança mútua? Primeiro a gente beija (para as iniciantes ou que tem mais convicção sobre certas atitudes, pois hoje o que se vê na verdade é “beijo na boca é coisa do passado, a moda agora é namorar pelado”, como diz a música), para depois conhecer. Experimenta e depois joga fora, como algo descartável. E passamos a pautar nossa vida pelas sensações da carne: desejo, tesão, atração, e só. Se a química bateu a gente tenta, senão vamos mudar de sabor. Onde foi parar o carinho, a afinidade, a amizade, o querer bem, o gostar pra valer? Será mesmo que o desejo carnal será suficiente para manter uma boa relação? Creio que não, uma boa relação está muito além disso. Como diz a frase: case-se com quem você gosta de conversar, pois beleza e sexo um dia acabam. Ainda que não estejamos falando aqui de casamento, creio que nas relações isto seja muito importante. Não há namoro que dure se não houver respeito, confiança, cuidado, carinho, companheirismo, compreensão, amor verdadeiro...

Ficar é normal, louco é quem pensa de outra forma

Não generalizo dizendo que todos estão neste ôba-ôba, que querem estar nesta micareta generalizada ou que tem a real noção que estão magoando outra pessoa dependendo da forma com que a trata. Mas a realidade é que, no Brasil, a cultura do descartável impera. Já virou normal. Louco é quem pensa de outra forma. Beijar na boca é bom, então que mal há? Se olharmos para outros países – e nem precisamos ir até o oriente ou ver “Caminho das índias” para provar o contrário –, veremos que no nosso país a sensualidade e o culto ao corpo falam mais alto e, por conseqüência, tudo o que está ligado a ele. As pessoas passam a ter apenas curvas no lugar do coração, não importa se ele vai bater mais por mim ou não, eu só quero beijar, beijar, beijar...

Dois mais dois nem sempre são quatro

Não digo também que não possa nascer alguma relação saudável de uma ficada de balada, pois já vi casos que deram certo, ou que, pelo menos aparentemente dão certo, mas posso dizer que é exceção. E aí é que está o perigo. No ficar de galho em galho, pula de um pra outro procurando alguém que possa dar certo, vc chega à conclusão (errada) de que todos os caras ou todas as mulheres não prestam. De que todos só querem zuada, de que todos só querem sexo, de que todos são iguais, que ninguém te quer pra valer, que não há compromisso verdadeiro, que os caras ou mulheres te querem, mas não querem te assumir porque isso envolve outras renúncias. Ou seja, eu não quero te ter, mas também não quero te perder. Como um brinquedinho na estante que brinco quando sinto vontade. E aí, pessoas tão diferentes, com experiências de vida tão particulares, se tornam iguais num termo pejorativo, por escolhas de vida que você mesmo fez.

Acredito que há vários casos. Eu já passei por três momentos: o de estar na balada só por zuada, por querer simplesmente o prazer momentâneo de ficar com alguém por revolta de relacionamentos passados, por carência, por conquista, por desejo, pra provar alguma coisa a mim mesma, para não ficar sozinha ou simplesmente para passar o tempo; o de estar na balada procurando por alguém que pudesse se encaixar no que procuro; e o de ir na balada apenas por diversão, para dançar, aproveitar a companhia das amigas e nada mais. Os dois primeiros casos não vejo como uma boa escolha, porque no primeiro eu posso ter magoado alguém que se interessou de verdade por mim enquanto eu só queria uma noite e nada mais, e no segundo porque o contrário também acontece e deixam resquícios não muito agradáveis (leia o tópico ironias do ficar).

Eu sou de todo mundo e todo mundo é meu também

E aí se forma o círculo, ou circo, que literalmente pega fogo: fulana fez isso comigo, logo ninguém quer nada com nada, logo eu vou fazer também. E quando se dá conta formou-se um hábito na sua vida, de relações superficiais, em que demonstrar o que sente não é visto com bons olhos, e que muitos dos que fazem é só da boca para fora. Por uma noite vc tem diversão, acha que a pessoa tem tudo a ver com vc, inclusive até sai com ela mais alguns dias, trocam carinhos, palavras bonitas, mas aquilo não vai pra frente por vários motivos: medo de se envolver e se magoar; medo de uma rejeição – é melhor ser de todo mundo e todo mundo ser meu, do que não ser de ninguém; por experiências de relacionamentos anteriores frustrados que fizeram você ficar desconfiado; oferta e procura muito grande – afinal, pra que eu vou ser só de uma se posso ser de várias; falta de objetivos comuns; e por aí vai. Mas a maioria dos casos que escuto a reclamação é esta: “Ninguém presta. A mulherada não está fácil. Os homens só querem sexo. As pessoas não têm conteúdo. O mundo virou uma micareta!”

O efeito dominó


Será que é possível passar conteúdo em uma noite? Será que a balada é o lugar mais apropriado para isto, com música alta, clima de pegação, etc, etc (falo da balada por ser o lugar em que mais acontece os exemplos que estou citando). Será que você realmente tem investido tempo nesta pessoa para conhecê-la melhor e assim poder responder justamente se ela tem ou não conteúdo? Se os homens só querem sexo será que as mulheres, de certa forma, também não estão reforçando esta situação de alguma maneira, pela exposição do corpo, por seduzirem e provocarem, por também não esperar conhecer melhor seu parceiro e deixarem o desejo e tesão no primeiro plano? Se a mulherada não ta fácil, será que os homens também não têm contribuído para isso, ao tratá-las como objetos de desejo e descartá-las, criando o efeito dominó em que elas se sentem no mesmo direito como num mecanismo de defesa, em que acabam tratando outra pessoa da mesma forma com que foi tratada? Se o mundo ta uma micareta, tenho contribuído para isso de alguma forma? Com certeza, ambos, homens e mulheres têm sua parcela de “culpa” para as coisas estarem do jeito que estão. O “problema” do ficar não digo nem que seja o ficar em si, mas principalmente todas as outras coisas que o ficar traz para a nossa vida sentimental: desânimo, desilusão, mágoas e outras conseqüências.

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Ironias do ficar


Vou citar um caso memorável: certa vez depois de resistir um pouco acabei ficando com um cara na balada. Resolvi abrir exceção pois já havia um bom tempo que eu buscava ficar quietinha e não me precipitar. A química foi perfeita e o cara muito carinhoso. Tipinho neném, que nem gosto rs (quem me conhece sabe que me amarro). Voltamos juntos e ficamos conversando até o dia amanhecer. Não rolou nada porque penso diferente da maioria a respeito da prática banalizada do sexo (que se aplica na mesma cultura do descartável, já exposto aqui), mas como a pegada era boa é claro que o cara tentou alguma coisa, embora me respeitasse ao eu dizer não. No dia seguinte assim que acordou já me mandou msg todo carinhoso e animado de me encontrar novamente. Almoçou e me ligou para combinar de passar na minha casa para passarmos a tarde juntos.

Fomos para um barzinho onde ele sabia que estavam alguns amigos e chegando lá sentamos com eles, me apresentando vários casais. Quem via parecíamos um casalzinho feliz, de mãos dadas, carinhosos uns com os outros, e falando até no futuro (ele, porque eu ficava quieta e fazia papel de durona, com pé atrás que sempre tive, mas confesso que lá no fundo fiquei derretida). Ficamos até de noite juntos, depois eu tinha marcado um compromisso e não pude continuar com ele. Mas havia comentado que no dia seguinte iria em um local. Meninas, pasmem. No outro dia, acho que nem 24h depois, o carinha todo carinhoso e fofo comigo estava já com outra.

Eu acho que meu queixo ficou caído durante uma meia hora. Fiquei sem entender nada. Sei que não tínhamos compromisso, mas poxa, no dia seguinte? No lugar onde saberia que eu estaria? Depois de falar um monte de coisas, de te apresentar pros amigos e ficar de casalzinho com vc a tarde inteira? A menina poderia até ser um rolinho dele mais antigo, mas então mostra que ele também não estava sendo bacana com ela, pois passou os dois dias anteriores comigo. Acho que essa vai ficar pra sempre... rs, tem que rir pra não chorar.

E o pior é que depois disso ele teve a cara de pau de chegar em mim de novo, como se nada tivesse acontecido. É claro que levou 3 nãos (sim, ele foi insistente). Acho que nenhuma química, por mais perfeita que seja, e nenhum cara, por mais que faça nosso tipo, vale isso, concordam? Respeito é fundamental. E se não respeitarmos a nós mesmas nenhum homem irá fazê-lo! É por estas e outras que ficamos confusas, sem entender ou tentando tirar conclusões precipitadas, do tipo: 1) ele é maluco; 2) ele só queria me levar pra cama pelo meu corpo e como não conseguiu caiu fora; 3) ele ta pensando que eu sou o quê? 4) por que ele me disse aquelas coisas e agiu daquela forma? 5) ele é assim com todo mundo e igual a todos os outros.

Será que isso me fez bem? Nos dois dias que fiquei com ele sim, pois por um minuto pensei que encontrei alguém atencioso, bacana, fofo como foi naqueles dois dias comigo, e bem ou mal eu supri uma carência momentânea. Mas pouco tempo depois dou de cara com a realidade, por conta de uma escolha que fiz naquele momento sem nem conhecê-lo direito. Paguei para ver, tive o que pedi rs... o ficar é isso aí. É estar sujeito a...

Eu não estou mais disposta a ter apenas momentos bons, mas ilusórios, com alguém que você curte somente naquelas horas, trocando carinhos como se fossem namorados, mas que logo depois está com outra pessoa e passado uns dias ainda quer voltar pra vc, sabe-se lá ate por quantas horas... Sei que tive outras experiências não traumáticas, rs... e algumas até muito legais porque houve carinho e respeito, consideração, e por um motivo ou outro não deu certo, ou porque um dos dois não estava disposto ou preparado para assumir um namoro, e que acabamos virando bons amigos. Mas de todas, estas foram exceções.

O que vi na maioria das vezes realmente foi uma curtição minha ou do cara, de passar um momento juntos, mas totalmente vazio. Algumas vezes já esperei pelo tal telefonema que aconteceu ou não, mas na maioria delas eu nem dava meu telefone porque não queria que o cara me ligasse no dia seguinte. Louco não? Mas cada um tem seu tempo, seu momento de enxergar as coisas e optar por mudanças. Chega uma hora que você precisa escolher. E certas escolhas envolvem renúncias, transformação.


Suas respostas te direcionam


Acredito que precisamos nos fazer algumas perguntas: o que estou buscando? O que quero para minha vida condiz com o que busco? Onde tenho buscado seria o lugar mais apropriado para o que quero para mim? De que forma tenho buscado e porque estou agindo desta forma? Tenho contribuído para que esta busca tenha sucesso? Estou pronta para um novo relacionamento ou tenho feridas que ainda precisam ser curadas para não afetar alguém que não tem nada a ver com meu passado? Tenho tratado as pessoas da maneira como gostaria de ser tratada?

Refleti muito sobre tais questionamentos, e quero compartilhar as respostas e experiências com vocês, mas estas serão expostas num próximo post. Espero que cada um que passar por aqui possa refletir um pouco sobre suas escolhas de vida nesta área sentimental. Que Deus nos abençõe e nos ajude a sempre fazer as melhores escolhas. Que a sua decisão seja a melhor para você e seu próximo.